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Nos tribunais portugueses, o papel do intérprete é indispensável para garantir um processo equitativo e inclusivo, especialmente porque envolve estrangeiros que não compreendem língua oficial do processo, no nosso caso, o português. Contudo, há desafios significativos que dificultam a eficácia do trabalho do intérprete e comprometem os direitos das partes envolvidas.
Enquadramento Legislativo
A legislação portuguesa, através do artigo 92.º do Código de Processo Penal (CPP), estabelece que a língua utilizada nos atos processuais deve ser o português. Contudo, quando uma das partes não compreende a língua, o tribunal deve nomear um intérprete qualificado, sem custos para o indivíduo envolvido. Este direito está alinhado com a Diretiva Europeia 2010/64/EU, que define padrões mínimos para garantir interpretação e tradução em processos penais.
Apesar do enquadramento legal, Portugal não possui regulamentação específica que defina critérios claros para formação, qualificação ou certificação de intérpretes em tribunal. Isso resulta na ausência de controlo sobre a qualidade, por um lado, e, por outro, na dependência da nomeação de intérpretes ad-hoc ou não qualificados.
Contextos da Interpretação de tribunal
A interpretação em contexto forense vai além das salas de audiências, sendo necessária em diversos cenários, tais como:
Tais cenários exigem competências específicas, adaptadas às necessidades e dinâmicas de cada ambiente. A ausência de regulamentação e formação especializada pode comprometer a eficiência e a justiça nesses contextos.
Remuneração Prevista no Regulamento das Custas Processuais
O Regulamento das Custas Processuais (RCP), através da Tabela IV, estabelece valores fixos para a remuneração de tradutores e intérpretes:
Esses valores estão entre os mais baixos da Europa, desincentivando a entrada de profissionais qualificados no mercado e contribuindo para a nomeação de indivíduos sem formação específica.
Tipos de Interpretação em Contexto Forense
Em contexto judicial, diferentes tipos de interpretação são exigidos, cada um com desafios e competências específicos:
Cada modalidade exige competências distintas, sendo imprescindível uma formação especializada para garantir a qualidade da tradução salvaguardando o conteúdo original.
Quem Nomeia os Intérpretes?
A nomeação de intérpretes é responsabilidade da autoridade judicial ou policial, como determinado pelo artigo 92.º do CPP. Contudo, muitas vezes, esta tarefa recai sobre as secretarias dos tribunais, que improvisam na seleção com base na disponibilidade local, sem critérios atinentes à real qualificação.
Ausência de Base de Dados Nacional
Embora a Diretiva Europeia 2010/64/EU recomende a criação de um registo oficial de intérpretes qualificados, Portugal ainda carece dessa estrutura. Outros países, como Reino Unido e Espanha, já possuem modelos que incluem a criação de registos nacionais para facilitar a consulta e a contratação de intérpretes habilitados.
Impactos e Consequências
A ausência de critérios regulamentares e formação apropriada afeta:
Propostas de Melhoria
Estas normas asseguram uma base sólida para a padronização e elevação da qualidade dos serviços de interpretação e tradução no contexto judicial.
Conclusão A interpretação nos tribunais portugueses exige atenção urgente para que o sistema judicial se adapte à crescente diversidade cultural e linguística. Regulamentações robustas, formação adequada e a adoção de normas como as ISO 17100 e ISO 20228:2019 são passos essenciais para garantir que os direitos linguísticos sejam plenamente respeitados, promovendo uma justiça verdadeiramente acessível e igualitária.
Biografia:
Elsa Rodrigues. Advogada, tradutora jurídica (EN/FR/ES>PT) e intérprete de tribunal (EN>PT>EN). Iniciou o seu percurso profissional como jurista do Governo de Macau (2001/2009). Mestre em Tradução pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra frequenta atualmente, nesta mesma casa, o programa de Doutoramento em Línguas Modernas: Culturas, Literaturas, Tradução. Associada afiliada do ITI (Institute of Translation and Interpreting, UK), Formadora certificada pelo IEFP (Instituto do Emprego e Formação Profissional, PT), integra, desde 2019, os órgãos sociais da APTRAD (Associação de Profissionais de Tradução e de Interpretação, PT)