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Hoje, conversámos com Marisol Mandarino, sobre alguns aspetos da sua profissão, sobre a importância do associativismo e ainda sobre alguns conselhos para a nova geração de profissionais.
APTRAD: Fale-nos um pouco sobre si, sobre como começou a sua carreira e o que é que a levou a escolher esta profissão.
Bem, sou nascida no Rio de Janeiro, filha de galegos que migraram para o Brasil, e creio que o fato de estar num contexto linguisticamente confuso, verbalizado oralmente em uma mistura de português-galego-castelhano-nordestino — sou filha de pais que, na Espanha, receberam pouca educação formal em castelhano escrito e que, antes de imigrar, não falavam/escreviam em galego fora de casa por conta do regime fascista de Franco e que, já no Brasil, eram imigrantes atuando do ramo da construção, com convívio intenso com nordestinos —, deve ter despertado em mim algum interesse pelo mundo das Letras lá no comecinho da minha história, seja porque um dia na escola eu disse tauba em vez de tábua,e todos riram de mim (sem traumas!), ou porque, numa aula de espanhol, eu disse chan em vez de suelo, e a professora me perguntou de onde eu havia tirado essa palavra. Essas pequenas vergonhas foram me incentivando a pesquisar cada vez mais. Iniciei meus estudos de inglês aos 12 anos e não parei mais. Aos 17 anos já sabia que queria ser tradutora, mas a minha família não tinha recursos para bancar o curso de tradução da PUC-RIO, único curso de tradução da cidade do Rio de Janeiro, e naquela época não era tão comum sair da casa dos pais para estudar em outra cidade ou país, então optei por fazer o curso de Letras numa universidade federal, custo zero, e depois ver outras opções para me aproximar do mundo da tradução. Aos 21 anos, já tinha o Certificate of Proficiency in English (CPE) da University of Cambridge e era Bacharel e Licenciada em Letras (português-inglês) pela Universidade Federal do Rio Janeiro. Um mês antes da formatura, já estava empregada numa multinacional do setor de informática. Havia sido contratada justamente por não ter experiência, mas também por ter estudado numa universidade com boa reputação no mercado. Daí vai o primeiro conselho para os novatos: façam de tudo para estudar em boas universidades. As portas se abrem mais facilmente. Fui contratada como documentadora de sistemas, mas na prática eu tinha um software inteiro para traduzir sozinha, além do manual de características (pré-venda), manual de operação, mensagens de erro, telas de ajuda, etc. Traduzia, revisava, imprimia, montava os manuais e qualificava o software. Foi uma oportunidade ímpar para ganhar responsabilidade, autonomia e autoconfiança, sempre assessorada por uma tradutora sênior, de quem tenho o prazer de ser amiga até hoje, mais de 30 anos depois. Num projeto, era um sistema da área de supermercados (pontos de venda – PVD), no outro o tema era administração hospitalar, depois automação de escritórios, etc. Foram quase 9 anos nesse mar de conhecimentos variados, mas chegou o dia em que começaram a despedir os tradutores da empresa por conta dos encargos trabalhistas. Como eu já traduzia para outras empresas nas horas vagas, não foi difícil passar para o próximo nível profissional. Despedida, abri minha primeira empresa para poder emitir notas fiscais e assim pagar menos impostos. Mas aí o meu marido foi transferido para a cidadezinha de Nioaque, no Mato Grosso do Sul, e achei melhor fechar a empresa para não sobrecarregar a minha sócia com a parte burocrática. Passei uns poucos anos trabalhando como autônoma, mas depois abri a Universus Traduções em 2008, que este ano vai completar 14 anos. Aliás, esse ano de 2008 foi decisivo pra mim: abri a empresa e passei no concurso de tradutores e intérpretes públicos do Estado de Minas Gerais, em inglês e espanhol.
APTRAD: Como descreveria um “dia normal” na sua vida profissional?
Literalmente, o normal é ficar de olho no relógio o dia inteiro e definir um montão de alarmes para não me esquecer de nada. A agenda é bem variada. Um dia normal pode ser traduzindo textos de saúde e de direito e certidões de nascimento/casamento, mas também pode ser estudando um tema espinhoso do Direito, organizando glossários no Multiterm ou batendo perna na rua atrás de certidões em cartórios. Mas eu diria que sempre começa com uma ou duas horas lendo e respondendo e-mails e publicações nas redes sociais, e mais uma meia hora da mesma peregrinação cibernética antes de encerrar o expediente 12 horas depois (!!!). Gosto de ser bem ativa nas redes sociais. É o meu antídoto para o isolamento na nossa caverna tradutória. Tenho inclusive um canal sobre traduções juramentadas no YouTube, que nasceu justamente quando percebi que gastava muito tempo respondendo sempre as mesmas dúvidas dos clientes de tradução juramentada. Quando recebia a mesma pergunta, mandava o link de um vídeo. Detesto respostas robotizadas. Elas até podem ser automatizadas para ganhar tempo no Whatsapp, mas gosto de sempre incluir alguma personalização aqui ou ali.
APTRAD: É membro de alguma associação/organização profissional? Se sim, o que a levou a associar-se e, se não, porque ainda não o fez?
Sim, sou secretária e também sócia-fundadora da Associação de Tradutores Públicos de Minas Gerais (ATP Minas), além de ser também filiada ao SINTRA (Sindicato Nacional dos Tradutores).
No início da carreira, reconheço que não fazia a menor ideia de como é importante pertencer a uma associação. Comecei me concentrando nas vantagens que poderia obter sendo associada, como descontos e congressos, mas hoje o meu foco é outro. São tantos os desafios, principalmente quando se trata do ofício de tradutor e intérprete público no Brasil, que o apoio de uma associação faz toda a diferença. Uma associação de tradutores é uma pessoa jurídica com legitimidade para representar os interesses da nossa categoria perante os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário do País. Para ter voz, a entidade precisa ter uma boa representatividade, ou seja, um alto percentual de adesão da categoria. Quem vai ouvir uma associação com meia dúzia de gatos-pingados? Precisamos unir forças e lutar juntos contra as dificuldades que se apresentam: a desvalorização da carreira, o excesso de cursos de baixa qualidade e a falta de visibilidade da profissão. Com a ISO 17100, traduzida recentemente para o português, creio que o cenário mudará para melhor em breve.
O nosso trabalho exige muita concentração e isolamento, o que dificulta a nossa união. Precisamos aprender a identificar nossos pontos comuns e definir nossas prioridades como categoria. Como tradutora não juramentada, as associações me ensinaram inicialmente a lidar com a papelada da vida de autônoma, política de preços, recebimentos do exterior, etc., mas hoje, como empresária, grande parte desse fardo fica por conta do contador, que mesmo assim muitas vezes aprende comigo sobre exportação de serviços de tradução e redução dos impostos dentro da lei. São raros os contadores no Brasil que entendem bem a nossa atividade profissional, infelizmente.
Como tradutora pública, entendi melhor, com a minha atividade nas associações de tradutores públicos e, recentemente, no grupo Juramentados Unidos, a relevância do meu papel como agente pública aprovada em concurso público para traduzir documentos com fé pública delegada pelo Estado, e até mesmo as diferenças entre a tradução pública, a tradução certificada e a tradução notarizada mundo afora.
APTRAD: Pela sua experiência, o que faz um “bom” profissional nesta área?
Em primeiro lugar, um bom tradutor tem que conhecer muito bem o seu idioma materno, o que poderá ser uma grande dificuldade para quem não tiver a formação em Letras. No Brasil, a profissão de tradutor é reconhecida, mas não é regulamentada, ou seja, não é preciso ter um diploma de Letras ou Tradução para atuar como tradutor profissional. Não defendo a regulamentação da profissão (muito pelo contrário), mas defendo que cada um preencha as lacunas que tiver na sua formação. Se adquiriu sua formação em Letras, poderia fazer outra graduação ou uma pós-graduação numa área do seu interesse (Direito, Farmácia, etc.); se veio de uma dessas áreas, faria um curso de Letras ou uma pós em tradução, mas já alerto que numa pós em tradução não se estuda a gramática com profundidade como num curso de Letras. Digo isso porque vejo que alguns colegas vacilam nas crases, no uso do subjuntivo e do hífen, nas vírgulas, e, em alguns momentos, esses erros prejudicam a compreensão do texto. Além disso, um texto mal redigido é um péssimo cartão de visitas, mesmo que a arte feita pelo designer no Canva tenha ficado ma-ra-vi-lho-sa.
Em segundo lugar, um bom tradutor tem que ter a curiosidade de um policial investigativo que não se contenta com meias respostas. Tem vezes que um termo exige umas 6 horas de pesquisa e não podemos desanimar. Alguns desistirão após 5 minutos de pesquisa, outros continuarão pesquisando durante as 6 horas.
Por último, gostaria de destacar a importância da ética do tradutor. Um profissional ético não joga o material do cliente em ferramentas de tradução automática, despedefação, etc. sem antes pedir permissão para tal, não impõe tarifas de miséria aos seus colaboradores, não sonega impostos, não atrasa suas entregas, não atrasa pagamentos, etc. Como disse o filósofo Kant, no século XVIII, “Age de tal forma que a máxima de sua ação seja uma lei universal”. Sim, tem inspiração na Bíblia (Lucas, capítulo 6, versículo 31). Traduzindo em miúdos: não faça com os clientes/colegas o que não gostaria que fizessem com você. O seu comportamento tem que ser um comportamento válido para todas as pessoas e situações, uma lei universal. Isso é ser ético.
APTRAD: O que gosta mais e o que gosta menos na sua profissão?
Gosto da falta de monotonia. Nos primeiros anos da minha carreira, traduzi muitos materiais de informática com “Clique aqui, clique ali”. Após um tempo, ficou muito chato e busquei outros rumos! Hoje traduzo textos bem diferentes no mesmo dia e aí me dou me conta de como somos ecléticos e absolutamente imprescindíveis em todos os setores da sociedade.
Do que eu menos gosto? Olha, amo tanto o que eu faço há 36 anos que diria que nada me desagrada. Faço tudo sozinha, desde o marketing até a emissão das minhas notas fiscais, a tradução propriamente dita, os estudos de um tema novo. Amo muito tudo isso! Nem tudo são flores, é claro, mas as dificuldades que encontro me instigam a buscar novas soluções. Pensando bem, para não dizer que gosto de tudo, tudo, tudo, eu não gosto de trabalhar sozinha. Estou sempre buscando parcerias porque aprendo muito com os meus colegas. Infelizmente, não é permitido dividir trabalhos de tradução juramentada no Brasil (trata-se de um ofício personalíssimo e levo isso muito a sério), mas gosto de ter parceiros nos demais trabalhos.
APTRAD: Que conselho daria a alguém que quer tornar-se tradutor e/ou intérprete?
Daria três conselhos:
APTRAD: Alguma coisa mais que gostasse de partilhar com os nossos leitores?
Gostaria de convidá-los a conhecer o meu canal no YouTube, o canal “Tradução Juramentada Viabilizando Sonhos”, onde apresento vídeos bem curtos sobre dúvidas sobre o ofício do tradutor público no Brasil, e também a página do Museu Virtual da Tradução Pública Brasileira, onde estou sempre recebendo materiais históricos sobre esse ofício que aprendi a amar!
APTRAD: Muito obrigado, Marisol, por ter respondido às nossas perguntas!
Para saber mais sobre a Marisol pode seguir as suas redes sociais em FB [https://www.facebook.com/marisol.mandarino/], Linkedin [https://www.linkedin.com/in/mmandarinotpic/], Instagram [@solmanda], twitter [@marisolmandarin] ou no YouTube [bit.ly/TJs4you].
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Biografia:
Marisol Mandarino é Tradutora Pública e Intérprete Comercial no Brasil, habilitada em inglês e espanhol. É Secretária da Associação de Tradutores Públicos de Minas Gerais (ATP Minas) e participa do grupo Juramentados Unidos. Cursou Bacharelado e Licenciatura em Português-Inglês (UFRJ), Especialização em tradução de inglês-português (PUC-RJ) e dois cursos de Pós-graduação — um de tradução e outro de interpretação — de espanhol-português (UGF), com passagem pelas cabines de interpretação inglês-espanhol da Universidad de Salamanca. Suas áreas de especialização são Tecnologia da Informação, Telecomunicações, Direito, Petróleo e Gás, Saúde, Recursos Humanos e Ecologia. Desde 2016, tem se dedicado ao estudo da legislação da Apostille. Defende a adoção da certificação digital nas traduções juramentadas desde 2009, o que finalmente se concretizou em 2021. Palestrante nacional e internacional (Brasil, Espanha e Portugal). É youtuber no canal Tradução Juramentada Viabilizando Sonhos (TJVS). Oferece cerca de 10 cursos para tradutores públicos pela Universus Traduções.