100 anos da Interpretação de Conferência

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100 anos da Interpretação de Conferência

A APTRAD esteve representada no evento comemorativo dos 100 anos da Interpretação de Conferência, pelos intérpretes Pedro Duarte e Hugo dos Reis Cosme, membros da APTRAD e professores de interpretação de conferência no ISCAP. O evento, organizado pela Faculdade de Tradução e Interpretação da Universidade de Genebra, decorreu nas instalações da Organização Internacional do Trabalho e reuniu durante dois dias profissionais da interpretação, académicos e diversas organizações que contam com os serviços de grande parte dos intérpretes contratados a nível mundial.

A conferência, subordinada ao tema “Looking back… and looking forward” permitiu a discussão da profissão que teve início há 100 anos e dos desafios que nos reservará o futuro, servindo ainda para incluir no debate os intérpretes de língua gestual que conta já com uma história de 225 anos. 

O formato “experimental” desta conferência que, além dos tradicionais keynote speakers e painéis de discussão, contou com apresentações num formato conhecido como Pecha Kucha (ou chitchat) possibilitou a partilha de diversas realidades, projetos e experiências, entre as quais o projeto levado pela APTRAD.

Esta conferência serviu para relembrar o papel que a interpretação tem tido no mundo e como sempre se pautou pelo trabalho em prol da paz das diferentes organizações que começaram a utilizar este tipo de serviço, como a OIT e, mais tarde, as Nações Unidas e a União Europeia, tendo esta última um papel muito importante com a sua política de multilinguismo.

No debate, o termo “serviço” foi diversas vezes motivo de destaque. Não obstante os diversos níveis da profissão, não há qualquer dúvida de que a interpretação é um serviço e deve ser analisado como tal, tendo sempre em conta a perspetiva do cliente (ou daquele que usufrui desse mesmo serviço). A discussão em torno do termo “serviço” levou invariavelmente à questão da sua qualidade, sobre quem define a qualidade do serviço, se as instituições de ensino, as instituições públicas internacionais, os clientes, os próprios intérpretes ou os investigadores). Trata-se de uma pergunta cuja resposta não se consegue obter de forma inequívoca e, pela nossa análise, vai sempre depender da realidade em que o serviço é prestado. Para além disso, há que ter em conta as diferentes necessidades de cada realidade e as diferentes respostas possíveis para essas mesmas necessidades. A avaliação do serviço estará assim sempre dependente das expectativas criadas.

A tecnologia foi, naturalmente, um dos pontos de debate da conferência onde ficaram patentes duas ideias bastante claras de que, por um lado, temos novas soluções tecnológicas que entram no campo de trabalho da interpretação e, por outro, não parece haver ainda nenhum tipo de tecnologia que venha a substituir os intérpretes. É certo que a forma como algum do trabalho é feito pode mudar, sendo disso exemplo o “novo” mercado da interpretação remota, ou do respeaking/interpretação para legendagem. Mas estas serão novas soluções, para novos mercados, ou para alterar algumas das configurações existentes onde o intérprete poderá (e deverá) ter de fazer alguns ajustes, mas onde continuará a ter esse papel tão essencial de mediador da comunicação entre diferentes línguas. Quando se fala de novas tecnologias, discute-se também quais as noções e conceitos relativos às novas possibilidades/modalidades de interpretação. Destacamos um apontamento interessante, relativamente a este tópico, de Uros Peterc, Presidente da AIIC: “estamos a discutir novos conceitos quando ainda não conseguimos concordar numa definição do que é a interpretação de conferência.”

Houve ainda lugar para se falar da investigação e da sua necessidade e aplicabilidade na profissão. Da discussão sobre este tema, ficou no ar a expectativa, por parte dos profissionais, de que a investigação deve resultar em algo aplicável na prática profissional.

A imposição do inglês como língua franca, ou o “globish” como referiram vários oradores, constitui também um desafio para os intérpretes de conferência. Como lidar com as diferentes variações da língua inglesa, por um lado, e como proteger a profissão que depende do multilinguismo. 

A APTRAD apresentou um projeto levado a cabo no ISCAP que pretende fazer uma ponte entre a formação e a experiência profissional dos intérpretes formados nesta instituição. O objetivo principal passa por responder à necessidade da obtenção de competências em ambiente profissional para que futuramente estes estudantes recém-formados possam entrar e singrar num mercado de trabalho onde a experiência é essencial. Para isso, damos aos alunos a oportunidade de, em equipa com intérpretes profissionais ou professores, trabalhar em eventos reais solicitados por clientes. Jacolyn Harmer, professora no Middleburt Institute of International Studies de Monterey na Califórnia, especialista em formação de formadores em interpretação, citou a apresentação da APTRAD para mencionar que a sua instituição faz um trabalho semelhante com um estágio curricular onde os alunos têm de organizar serviços de interpretação, montar as próprias equipas e prestar serviço em eventos da comunidade local. Uma das grandes diferenças, quando comparado com o projeto português, tem a ver com o pagamento, uma vez que os nossos alunos são pagos pelo trabalho realizado, auferindo exatamente o mesmo valor que o chefe de cabine para esse projeto. 

A participação nesta conferência permitiu-nos verificar que APTRAD e ISCAP estão na linha da frente da formação e do apoio aos profissionais da interpretação.

Na foto: Pedro Duarte, Hugo dos Reis Cosme e Cristiana Ferraz Coimbra